sábado, 12 de setembro de 2020

A VIAGEM

 

Mal cabia em si de tanta felicidade. Sim, mais uma viagem iria começar. Ela se sentia renovada, cheia de expectativa pelas descobertas que certamente viriam.

     Era como se fosse um prêmio para si mesma: nada como sair da rotina e fazer um mergulho profundo num outro universo. Que personagens iria encontrar? Talvez algumas pessoas tivessem algo em comum com ela mesma, um coração sensível e delicado, muitas vezes machucado pela brutalidade do mundo. Talvez encontrasse tipos envolventes, carismáticos e sedutores, aquelas pessoas que ela sempre admirou por saberem aproveitar a vida com intensidade.

     Se interessava mais por gente do que por paisagens. É claro que adorava conhecer novos lugares, mas o que a fascinava mesmo era a história de vida de cada pessoa que iria conhecer. Os dramas, as vitórias, os costumes, a personalidade de cada novo companheiro que esta aventura iria lhe trazer.

     Já havia conhecido muitos tipos inesquecíveis em outras viagens. Gente que a marcou profundamente por tocar de modo tão intenso e transformador os seus sentimentos. Gente que acrescentou alegria, paz, fé, compaixão, através de histórias que muitas vezes a fizeram rir, embora outras lhe arrancassem lágrimas. Se envolvia inteiramente com cada tipo que lhe chamava a atenção. Mesmo que soubesse que não iria ficar com eles para sempre, pois haveria um momento em que teria que voltar para sua rotina, fazia questão de se colocar inteira, como amiga e confidente, de pessoas que se tornariam íntimas e queridas durante estes dias diferentes e cheios de surpresas.

     Já havia rodado o mundo inteiro. Conheceu o glamour das celebridades, se emocionou com a vida sofrida dos moradores de rua, se divertiu com jovens, aprendeu com idosos, sonhou com adolescentes, se apaixonou por homens, se identificou com outras mulheres, lutou em favor dos negros, apoiou os homossexuais. Aprofundou seus conhecimentos sobre política, cultura, religião. Conheceu o dia a dia de roqueiros, sambistas e sertanejos. Já se sentiu como se vivesse no futuro ou amarrada ao passado. Descobriu o frio das geleiras, o calor do deserto. Viveu a agitação das metrópoles e a vida pacata do interior. Trazia dentro de si toda a pluralidade do mundo.

     É por isso que amava tanto as suas viagens. Quando a aventura chegava ao fim, era tomada por um imenso sentimento de gratidão. Sentia-se transformada, enriquecida e emocionada por viver momentos tão maravilhosos.

     Cada vez mais, repetia para si mesma: nada como se deixar envolver inteiramente por um bom livro. E, cheia de entusiasmo, abriu a primeira página.

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